sexta-feira, 4 de julho de 2014

“Na Batalha” a um passinho do céu!




Quase todo mundo já ouviu falar da batalha do passinho. Mas o musical “Na Batalha”, transcende. Mais que um espetáculo de dança, o musical mostra a batalha do cotidiano da favela através de um misto de linguagens artísticas. Teatro, baile, show, dança afro-contemporânea, tecno-funk-rave, projeções de artes visuais alucinantes... “Na Batalha” é tudo isso e algo mais.

Depois de assistir ao espetáculo no Teatro João Caetano, conversei com Vadinho, cantor e um dos compositores do musical. Ele explicou o trabalho da bailarina (Lavínia Bizzotto) que ensinou os meninos do passinho, acostumados ao improviso frenético do baile, à baixar a adrenalina e contar tempos. O que eu vi foi uma dança contemporânea, diferente de tudo que eu conheço, animada, emocionante, mas sem aquela áurea sombria e incompreensível que alguns espetáculos de dança pós-modernas tem.

Ele também falou sobre a composição das letras escritas para o musical, sob a direção do escritor Julio Ludemir, que também é oriundo de favela e possui uma longa trajetória em assuntos polêmicos da periferia. Dessa parceria, surgiram letras simplesmente maravilhosas que contam de uma forma singular a história das diversas batalhas do morador de comunidade, abordando os assuntos cruciais para o debate contemporâneo.

O espetáculo poderia facilmente cair no exotismo ou no didatismo, mas não o faz. Ele oferece um panorama do funk desde as raízes na soul music americana, mas vai muito além da temática da dança tocando em questões complexas de uma forma muito autoral e  para além do politicamente correto. Quer ver?

“Já cheirei chorando
Só fui me acabando
Já fumei sabendo que eu estava me matando.
Praia, funk, futebol
No meu Rio da empate
Nem a guerra do Iraque
É mais forte que o crack.”
(trecho da canção Na Batalha do Crack)

Sentiu a pressão? Enquanto rola essa letra, tem um muleke sinistro que dança os movimentos do crakudo de um jeito de arrepiar a alma. Já “Na Batalha da Dignidade”, os meninos encenam a típica “dura” que o negro pobre está acostumado a receber da polícia.

“Eu já pedi seu moço
não bate na minha cara
eu sou trabalhador
não sou bandido não.
Posso ser negro na cor
mas minha bandeira é branca.
deixa a minha vida mansa eu levar"

Esse papo reto, rimado e ritmado vai tocando o público e ajuda quem não está próximo a essa realidade a perceber a realidade de um jeito diferente do que costuma ser retratado pela mídia.

Vadinho também comentou, que os meninos do passinho de vez em quando lembram frases das músicas em alguma  conversa. Ou seja, é letra para desenrolar. É a arte servindo ao diálogo, arma poderosa  na “Batalha da Mente”:

 “É hip hop, oficina de cinema, capoeira, percussão, grafite, balé, judô...
 Geral tá querendo entrar na mente do menor bolado.
 Geral tá querendo levar o menor bolado no desenrolado”.  

Eu também sou dessas pessoas que estão querendo entrar na mente do menor bolado, fazendo projeto social na favela e etc... Fiquei muito feliz por conseguir ingresso para os adolescentes do Projeto Turista Aprendiz assistirem ao espetáculo neste sábado. Mas a via é de mão dupla e que essas letras também já entraram na minha cabeça. E é esse diálogo que faz muita falta na nossa cidade partida de estereótipos e preconceito.

Mas trocar ideia não é só concordar e aplaudir. Mesmo tendo me encantado com a peça não posso dizer que gostei de tudo. Faltou uma voz feminina. Eu queria saber da batalha da mulher na favela. Logico que a única dançarina representou perfeitamente o gênero. Mas ainda foi pouco. A canção “O Gigante Acordou” diz que na seleção brasileira do trabalhador até as minas estão convocadas – uma referencia ao futebol como esporte só de homens – verdade, mas é preciso lembrar que as mulheres da favela não só estão convocadas necessariamente para esta seleção como para muitas outras em múltiplas jornadas de trabalho, casa e crianças.

Outra crítica pode ser feita à música que diz:

“Quando eu lanço o meu Nike no pé
sinto o meu corpo flutuar
só deus sabe o duro que eu dei
quanto que eu ralei
para poder me bancar”

Uma clara apologia ao consumo, que droga! O grande paradoxo é que não há Nike no mundo faça esses meninos flutuarem como eles fazem naquele palco. Se por um lado dizem que “o que importa é dinheiro no bolso ser considerado e gastar com as novinhas”, por outro, estão fazendo arte de tal qualidade que os torna capazes de conquistar corações independente da conta bancária.

Mas não quero fazer patrulha ideológica. Prefiro fazer como os personagens Betinho e Carlinhos, de universos e classes sociais diferentes que aprendem um com o outro na Batalha do Playground.

“ É a batalha do play, é  batalha do play
Tu me ensina o que tu sabe
Que eu te ensino o que eu sei”

Fico feliz de saber que os garotos vão para Nova York. Lá, com certeza vão fazer os gringos pirar. Mas tomara que disponibilizem a tradução das letras das canções para sustentar a mensagem, embora a expressão corporal também seja capaz de comunicar. Espero também, que este muleques levem a arte para toda a parte e sigam adiante desenvolvendo e amadurecendo o trabalho.

“Na Batalha” deve ser visto do chão, no corpo a corpo da favela, por quem pode ser ver nesta expressão e dançar junto com a galera. Ao mesmo tempo, o musical merece os palcos. Sendo do morro, vem do alto e nos eleva. Esses anjos flexíveis fascinam, iluminam e nos revelam que na batalha se está a um passinho do céu.

Agora eu me pergunto:

“Será que lá na lua algum astronauta viu
Na face do planeta as favelas do Brasil?”


Por:
Alice Souto – ally_paiva@yahoo.com.br

Poeta, Psicóloga e produtora do projeto Turista Aprendiz.

terça-feira, 1 de julho de 2014

Cansei de ser princesa



No  palácio do meu corpo
Fiz do trovador um rei 
Fetiche que criei 
Para realizar encanto

Crê que me domina
Mas não imagina
Se achando príncipe
Que sentada no seu trono
Faço dele um bobo

[Apenas mais um homem] 

Por isso esse asco 
Por histórias de palácio 
Prefiro as praças

Vou deitar com os operários!

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