Sempre fui a criança que não queria sair da água. A maravilha do mar todos os dias na férias ao longo do ano era
rara. Se alguém me acenava com a mínima possibilidade de me levar à praia, mesmo
que fosse apenas uma vez e só dali a um mês, meu coração já se enchia de
alegria. Eu pensava nisso todos os dias. Frequentemente os adultos de
esqueciam do que pra mim era promessa. Então, diante da cobrança, eles riam ou
se enfureciam, dependendo de seu estado de espírito.
Adultos mudam de humor e
reagem de maneiras imprevisíveis para as crianças. Quando a gente cresce
entende que isso tem a ver com questões financeiras, de saúde, de trabalho e
etc..., fatores incompreensíveis para as crianças, a não ser que os adultos
expliquem para elas (o que não era o caso).
Todas as vezes que os adultos destruíam as minhas
esperanças eu envelhecia. Na minha cabecinha infantil, achava que se mudavam de
ideia a culpa era minha. Por isso, passava horas criando estratégias
infalíveis, o momento ideal e a palavra certa para que cumprissem com o
prometido. Sem nunca deixar perceberam o quanto aquilo era importante para mim
– pois isso poderia gerar eternas manipulações (“se você não fizer isso eu não
te levo a praia”). Mesmo com tanto esforço, nem sempre tive sucesso.
Hoje eu comemorei o dia das crianças indo à praia sozinha
de bicicleta. A gente deixa a bolsa com uma tia simpática e pode desfrutar do
prazer infantil de brincar com as ondas durante horas. Até hoje eu sinto menos
frio na água do que os outros adultos. É um máximo não ter que depender de
ninguém para me levar a praia. Eu até preferia ter ido com algum amigo. Mas
sempre quando combinam e não vão, eles reativam a minha frustração infantil e
me deixam muito zangada. Por outro lado, já até me apaixonei por um garoto
quando acordou cedo e me levou à uma praia diferente num dia comum. Até hoje me
pego inventando estratégias sem sucesso para evitar que furem comigo. Mas são
cariocas, saem de noite, ficam de ressaca, acordam tarde... Se até eu mesma nem
sempre consigo fazer o que eu quero, não posso achar que o que o outro faz pode
depender de alguma coisa que eu diga. Depois da infância que eu tive, pelo
menos essa lição acho que aprendi.
Viajando com esses pensamentos na cabeça, quando eu já
estava explorando todas as variações de rimas para “amor” e “mar”, passa perto
um bebum tarado da porra cortando a minha onda infantil. A gente tem que se
ligar. Quando eu era criança não tinha que me preocupar com nada disso. Tinha
meu pai por perto para tomar conta de mim. Minha mãe frenética no protetor
solar. Devia dar muito trabalho cuidar da criançada na praia! Hoje mulher
sozinha, curti a delícia da independência na praia e senti saudade dos meus
pais.