domingo, 19 de outubro de 2014

Sem sol




Ontem eu e uma multidão fomos à praia de Ipanema a espera de um dia semi-ensolarado, como o que fazia em nossos bairros mais ao norte. Mas, ao desembarcar na General Osório, gemia o povo em ais, reclamando sua sorte. Bem que o amigo zona sul tinha me avisado da nuvem que pairava sobre a praia... mas eu não escutei. Quem sempre morou longe do mar e o sente como coisa rara, é capaz de aproveitá-lo até mesmo em sábados nublados. Mas por aquele vento frio, eu não esperava. Então, irritada, engrossei o coro, repetindo mesma reação de cada ser humano suburbano que tinha vindo atrás e que viria adiante. Depois disso sorri sonoramente mostrando os dentes entre os semelhantes. Não há frustração que resista intacta ao ser compartilhada. Nós, que acreditamos no sol, nunca estamos sós. Não a falta de sol, mas a solidão é nosso único mal.

Acidente

A porta do metro prendeu o braço do moço. Ele, do lado de dentro, com o braço prensado ficou sem nenhuma expressão. Aos poucos, os passageiros foram percebendo assustados a situação. Alguém foi puxar uma alavanca para parar o carro, mas ele disse que não tinha necessidade, a outra estação estava perto. Uma senhora disse que antes dele chegar, ia ter o braço arrancado pelas ferragens, causando certo alarde. Dois cidadãos de bom senso finalmente tiveram a ideia de forçar a abertura da porta. O homem conseguiu retirar o braço com o trem em movimento. Agradeceu e se desculpou, visivelmente constrangido. Na hora, me lembrei da história de uma criança que passou uma viagem inteira com o dedo preso pela porta do carro segurando o choro porque não queria que seu pai visse. Porque mesmo tendo o sido o pai que havia fechado a porta, sabia que o velho ia dar um jeito de colocar a culpa nele. Me senti horrível com essa história e fiquei tentado lembrar que paciente havia me contato isso. Depois suspirei aliviada, não foi paciente, foi no livro do J.P Cuenca - "O único final feliz para uma história de amor é um acidente". Ainda bem que era só ficção. Mas diante do acidente de hoje, não poderia ser mais real.

Maçã com canela


Metade da laranja nada. Amor são dois pedaços de maçã em forma de coração que aparecem para você no seu café da manhã. Mas não basta testemunhar o milagre dos pedaços que se encontram por acaso. Nem sentir na boca a canela do seu adocicado. Precisa fazer foto e postar no face. O amor quer ser compartilhado.

terça-feira, 30 de setembro de 2014

No ponto

Meu coração está parado no ponto esperando um ônibus para Niterói. Todo mundo diz que passa, mas 40 minutos e nada. Solidários, os solitários vão dando informações. E por mais que acreditem nelas, nunca sabem ao certo se vale a pena esperar. Meu coração é tão absurdo como um ônibus escrito "barcas" que não passa pelas barcas porque a Perimetral foi derrubada. Aí você tem que andar até depois do ponto final e alterar o cronograma sem drama, pois nessa cidade, nessa idade... Tudo isso é normal. Meu coração não tem condições de cumprir com o combinado, vai decepcionar os outros corações. Por isso, se lança no oceano e desfruta o balanço inseguro do mar. Sorver cada naco de beleza que se insinua da janela, ignorando a espera e sabendo que não há salva-vidas para o amor. Meu coração se salva lendo Carlos Meijueiro do celular, escreve poema e reinventa sentido para o tempo perdido no trânsito.

A musa da solidão

Como sentia frio no filme europeu, a musa do cinema se descolou da tela. Resolveu dar um rolê pelo Festival do Rio. Achou que causaria espanto, mas os homens nem reparam. Estão muito concentrados em seus telefones celulares, repletos de whatsapps, após a sessão. Quanta ingenuidade! Ela acreditara que aqueles os olhares eram todos para ela. Que os moços bonitos desejavam tê-la. Só que não. Eles preferem a tela. O único capaz de nota-la foi o velho, da era pré-tinder, ainda do tempo da paquera. Ele pisca e anuncia saber-se velho, "não pretendo assedia-la". Assinando sua sentença: "mala". A doce personagem, solitária, aceita solenemente sua companhia. De repente, todos os olhares se voltam novamente para ela. Só agora compreende: eles têm medo. Mulheres sozinhas, sobretudo belas, são um perigo. Convém evita-las. O velho insiste por seu telefone. Ela responde com ternura: "preferiria não". E retorna para sua tela, repleta de humanidade, a musa da solidão.

domingo, 31 de agosto de 2014

Focando na carreira

Lola analista sendo entendida no assunto da psicanálise está ciente do fato de que por trás de certas verbalizações há um significado inconsciente. O homem diz: “não quero namorar, estou focando na carreira” mas isso é apenas um mecanismo de defesa contra um anseio secreto e intenso por um relacionamento. Lola depois utilizar sua inteligência analítica para evidenciar tal mecanismo para alguns de seus parceiros teve comprovada sua teoria. Pouco tempo depois de lhe deixarem, agradecidos (ou não), eles se engajaram em relacionamentos sérios, dentre os quais 5 namoros , 1 noivado e 2 casamentos. Agora Lola largou de analisar seus casos amorosos e resolveu simplesmente escutar o que os homens dizem ao pé da letra. Se ter um relacionamento com quem quer já é difícil, imagina com quem não quer! Por isso, quando a coisa fica muito contraditória, ela só diz que não entendeu e vai embora. Em seis meses da nova atitude ela contou dois pedidos de namoro, 36 coraçõezinhos no Whatsapp, mais meia dúzia de declarações de amor imbox, catou cinco cacos de coração partido de seus pés, encheu uma garrafa pet de lágrimas dos caras e indicou quatro para a terapia. Agora Lola pensa em criar uma parceria com as jovens psicólogas solteiras do Rio de Janeiro, na qual cada um atenderá os ex. ficantes da outra. Se todas adotarem a nova atitude, seus consultórios vão ficar cheios! Entendam rapazes, agora Lola está sem tempo para relacionamento, focando na carreira, focando na carreira.

sexta-feira, 4 de julho de 2014

“Na Batalha” a um passinho do céu!




Quase todo mundo já ouviu falar da batalha do passinho. Mas o musical “Na Batalha”, transcende. Mais que um espetáculo de dança, o musical mostra a batalha do cotidiano da favela através de um misto de linguagens artísticas. Teatro, baile, show, dança afro-contemporânea, tecno-funk-rave, projeções de artes visuais alucinantes... “Na Batalha” é tudo isso e algo mais.

Depois de assistir ao espetáculo no Teatro João Caetano, conversei com Vadinho, cantor e um dos compositores do musical. Ele explicou o trabalho da bailarina (Lavínia Bizzotto) que ensinou os meninos do passinho, acostumados ao improviso frenético do baile, à baixar a adrenalina e contar tempos. O que eu vi foi uma dança contemporânea, diferente de tudo que eu conheço, animada, emocionante, mas sem aquela áurea sombria e incompreensível que alguns espetáculos de dança pós-modernas tem.

Ele também falou sobre a composição das letras escritas para o musical, sob a direção do escritor Julio Ludemir, que também é oriundo de favela e possui uma longa trajetória em assuntos polêmicos da periferia. Dessa parceria, surgiram letras simplesmente maravilhosas que contam de uma forma singular a história das diversas batalhas do morador de comunidade, abordando os assuntos cruciais para o debate contemporâneo.

O espetáculo poderia facilmente cair no exotismo ou no didatismo, mas não o faz. Ele oferece um panorama do funk desde as raízes na soul music americana, mas vai muito além da temática da dança tocando em questões complexas de uma forma muito autoral e  para além do politicamente correto. Quer ver?

“Já cheirei chorando
Só fui me acabando
Já fumei sabendo que eu estava me matando.
Praia, funk, futebol
No meu Rio da empate
Nem a guerra do Iraque
É mais forte que o crack.”
(trecho da canção Na Batalha do Crack)

Sentiu a pressão? Enquanto rola essa letra, tem um muleke sinistro que dança os movimentos do crakudo de um jeito de arrepiar a alma. Já “Na Batalha da Dignidade”, os meninos encenam a típica “dura” que o negro pobre está acostumado a receber da polícia.

“Eu já pedi seu moço
não bate na minha cara
eu sou trabalhador
não sou bandido não.
Posso ser negro na cor
mas minha bandeira é branca.
deixa a minha vida mansa eu levar"

Esse papo reto, rimado e ritmado vai tocando o público e ajuda quem não está próximo a essa realidade a perceber a realidade de um jeito diferente do que costuma ser retratado pela mídia.

Vadinho também comentou, que os meninos do passinho de vez em quando lembram frases das músicas em alguma  conversa. Ou seja, é letra para desenrolar. É a arte servindo ao diálogo, arma poderosa  na “Batalha da Mente”:

 “É hip hop, oficina de cinema, capoeira, percussão, grafite, balé, judô...
 Geral tá querendo entrar na mente do menor bolado.
 Geral tá querendo levar o menor bolado no desenrolado”.  

Eu também sou dessas pessoas que estão querendo entrar na mente do menor bolado, fazendo projeto social na favela e etc... Fiquei muito feliz por conseguir ingresso para os adolescentes do Projeto Turista Aprendiz assistirem ao espetáculo neste sábado. Mas a via é de mão dupla e que essas letras também já entraram na minha cabeça. E é esse diálogo que faz muita falta na nossa cidade partida de estereótipos e preconceito.

Mas trocar ideia não é só concordar e aplaudir. Mesmo tendo me encantado com a peça não posso dizer que gostei de tudo. Faltou uma voz feminina. Eu queria saber da batalha da mulher na favela. Logico que a única dançarina representou perfeitamente o gênero. Mas ainda foi pouco. A canção “O Gigante Acordou” diz que na seleção brasileira do trabalhador até as minas estão convocadas – uma referencia ao futebol como esporte só de homens – verdade, mas é preciso lembrar que as mulheres da favela não só estão convocadas necessariamente para esta seleção como para muitas outras em múltiplas jornadas de trabalho, casa e crianças.

Outra crítica pode ser feita à música que diz:

“Quando eu lanço o meu Nike no pé
sinto o meu corpo flutuar
só deus sabe o duro que eu dei
quanto que eu ralei
para poder me bancar”

Uma clara apologia ao consumo, que droga! O grande paradoxo é que não há Nike no mundo faça esses meninos flutuarem como eles fazem naquele palco. Se por um lado dizem que “o que importa é dinheiro no bolso ser considerado e gastar com as novinhas”, por outro, estão fazendo arte de tal qualidade que os torna capazes de conquistar corações independente da conta bancária.

Mas não quero fazer patrulha ideológica. Prefiro fazer como os personagens Betinho e Carlinhos, de universos e classes sociais diferentes que aprendem um com o outro na Batalha do Playground.

“ É a batalha do play, é  batalha do play
Tu me ensina o que tu sabe
Que eu te ensino o que eu sei”

Fico feliz de saber que os garotos vão para Nova York. Lá, com certeza vão fazer os gringos pirar. Mas tomara que disponibilizem a tradução das letras das canções para sustentar a mensagem, embora a expressão corporal também seja capaz de comunicar. Espero também, que este muleques levem a arte para toda a parte e sigam adiante desenvolvendo e amadurecendo o trabalho.

“Na Batalha” deve ser visto do chão, no corpo a corpo da favela, por quem pode ser ver nesta expressão e dançar junto com a galera. Ao mesmo tempo, o musical merece os palcos. Sendo do morro, vem do alto e nos eleva. Esses anjos flexíveis fascinam, iluminam e nos revelam que na batalha se está a um passinho do céu.

Agora eu me pergunto:

“Será que lá na lua algum astronauta viu
Na face do planeta as favelas do Brasil?”


Por:
Alice Souto – ally_paiva@yahoo.com.br

Poeta, Psicóloga e produtora do projeto Turista Aprendiz.

terça-feira, 1 de julho de 2014

Cansei de ser princesa



No  palácio do meu corpo
Fiz do trovador um rei 
Fetiche que criei 
Para realizar encanto

Crê que me domina
Mas não imagina
Se achando príncipe
Que sentada no seu trono
Faço dele um bobo

[Apenas mais um homem] 

Por isso esse asco 
Por histórias de palácio 
Prefiro as praças

Vou deitar com os operários!

domingo, 15 de junho de 2014

Especulação Amorbiliária



Sendo super valorizado
Fez reserva de mercado
Mas deu furo.


Era superfaturado... 

Síntese Solteira



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