domingo, 25 de abril de 2010

Pelo bordado de Penélope

Há quem creia na virtude
E caminhe sobre a lisa superfície da moral
Em percurso retilíneo
do fino trato social

Gente que crê no dinheiro ou no Diabo
E tropeça vez por outra na culpa do pecado
Vida em mundo pré-determinado
Caminhando de olho fechado

I – Por um lado

Há quem, por um lado
Note que o caminho é vidro fino
Sobre a vasta superfície da água

O mergulho é uma loucura
Cair em si a vida em fluxo
Extravasando a estrutura

Há de se desesperar
De descaminho
E buscar da água o vinho
Um lugar pra se agarrar

Veneno que assegure
alguma fruição
Ética etílica
De frágil definição
Uma gota molhada na razão do mapa
E retorno certo pelo empuxo da ressaca
(De cara com o vidro
careta no chão)

Escolher sem pejo
a substância do desejo
O luxo de fluir
para certa direção
Caminho de si à si
Cujo fim
é o início
Fissura de vidro
pelo vício
A saber de antemão
O destino que me ( a) cabe
E me deságüe.


II – Pelo contrário

Há quem, pelo contrário
Mergulhe de cabeça
E o caminho esqueça
Pela cachoeira do juízo desça
Precipício no vazio
Corpo entregue em sacrifício,
Ao canto da sereia, no fundo do rio.


III – Entretanto

Há quem, entretanto
Nem mesmo à resposta do vício acuda
O canto da sereia escuta
Amarrado ao mastro do mar

Navegante atento
Sob os pés só o vazio
Ilusões não mais pescadas

Verdades submersas
E vontades que se fiam juntas
Redes de corações

És Ulisses enlaçado
No bordado de Penélope
Pelo fio de Ariádne

Atento à beleza e ao fio da razão
Tua sabedoria
É tua pena
Fruir um fio da maravilha breve
Experimentar o desejo do mar que não deve
E viver uma vida toda sem vê-la

Tua heroína é Penélope
Tua salvação
Da sereia da vontade passageira
À princesa do reinado redenção.

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